Caro Gates, o desenvolvimento humano e a adaptação climática podem andar de mãos dadas
2025

Precisamos de um novo paradigma para redirecionar os US$ 7 trilhões por ano em subsídios públicos para combustíveis fósseis. Por Eric Ezechieli - cofundador da NATIVA
Antes da Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP), marcada para 7 de novembro em Belém, no coração da Amazônia, Bill Gates publicou um artigo em seu blog com o título revelador: “Três verdades difíceis sobre o clima”. O texto gerou um amplo debate internacional, com interpretações contrastantes: alguns expressaram total concordância com a mensagem, enquanto outros viram essa postura como uma mudança radical em relação ao compromisso que o fundador da Microsoft tem demonstrado nos últimos anos na luta contra as mudanças climáticas.
O artigo de Gates, sem dúvida, apresenta argumentos com os quais se pode concordar: reconhece a gravidade das mudanças climáticas e a necessidade de enfrentá-las; enfatiza a importância de apoiar inovações que nos levem a uma economia descarbonizada; e, finalmente, argumenta que o bem-estar humano deve ser colocado no centro das estratégias climáticas.
O que merece uma análise crítica é a solução final proposta por Gates e a abordagem metodológica que a sustenta. Segundo o magnata americano, para reduzir e limitar os danos causados pela crise climática, especialmente nos países mais vulneráveis — que também são os mais pobres —, há apenas uma resposta: o crescimento econômico.
A “nova” visão de Gates levanta questões em três frentes. A primeira diz respeito à própria natureza da solução, que apresenta uma visão distintamente centrada nos Estados Unidos. Como o analista geopolítico Dario Fabbri frequentemente aponta, é um erro pensar que todos os povos do mundo querem abraçá-la. Os EUA representam 4,2% da população mundial, precisamente aquela que há décadas vem mostrando sinais claros de deterioração da condição humana em geral, por exemplo, em termos de aumento da desigualdade, piora da saúde física e mental e aumento da violência. Qualquer ideia de futuro, de desenvolvimento e de resolução da crise de sustentabilidade que não integre uma pluralidade de vozes e pontos de vista, especialmente aqueles que terão que descobrir como lidar com a crise climática nos próximos anos, não pode ser sólida. Se há um lugar designado para identificar essa visão, há anos ele é a COP.
O segundo ponto é ainda mais substancial: é difícil resolver um problema com o mesmo modelo que o criou. A atual crise de sustentabilidade é resultado de um modelo econômico extrativista. É verdade que o crescimento econômico provou ser o principal impulsionador da melhoria da condição humana, mas há um ponto além do qual, se permanecermos dentro do modelo atual, a correlação se inverte e, a longo prazo, o crescimento econômico por si só corre o risco de corroer o bem-estar. O conceito de crescimento é legítimo, mas não pode ser proposto como uma panaceia sem primeiro transformar radicalmente a maneira atual de pensar e agir. Se queremos que a economia resolva os problemas de hoje e de amanhã — e ela tem potencial para isso —, é essencial orientá-la para um paradigma regenerativo: uma abordagem em que as organizações geram mais valor (econômico, social e ambiental) do que extraem para funcionar. Um modelo que não se opõe à competitividade e à sustentabilidade, mas as integra e gera valor compartilhado entre comunidades, trabalhadores, o planeta e acionistas.
Terceira reflexão: atualmente, conforme relatado pelo Fundo Monetário Internacional, a produção e o uso de carvão, petróleo e gás se beneficiam de mais de US$ 7 trilhões por ano (cerca de 6% do PIB global) em subsídios aos combustíveis fósseis. Esse valor exorbitante torna a indústria competitiva com alternativas limpas e renováveis. Na verdade, os governos estão prolongando a vida útil de um modelo energético poluente e arriscado do ponto de vista geopolítico. Uma ação com um retorno social e ambiental muito alto, além de econômico, dado que a descarbonização é lucrativa, seria redirecionar esses imensos subsídios para a transição, bem como para programas educacionais, de saúde e de desenvolvimento baseados em um paradigma regenerativo. Nesse ponto, a “preocupação” de Gates — de que os recursos para a mitigação das emissões são escassos e competem com os destinados ao combate à pobreza e às doenças — também seria resolvida.
Tenha uma boa COP!








