Desde 2016, existe um status jurídico corporativo na Itália com o potencial de redefinir os rumos do capitalismo. Mais de 3000 (2023) empresas já o adotaram.
Do artigo de Paolo Di Cesare e Eric Ezechieli publicado em ilsole24ore.com
Há 50 anos, Milton Friedman apresentou sua doutrina ao mundo, segundo a qual as empresas socialmente responsáveis devem se concentrar em um único objetivo: maximizar o valor criado para seus acionistas. Tornou-se imperativo para gestores, dessa maneira, focar exclusivamente em uma única variável: o lucro. A interpretação monoteísta introduzida por Friedman é uma expressão do paradigma que dominou a humanidade e o planeta nos últimos 50 anos. Porém, involuntariamente, ele violou as leis da física: Nada pode crescer infinitamente em um sistema finito, e qualquer sistema complexo que maximize uma única variável inevitavelmente acelera até a autodestruição.
Duas variáveis fundamentais estavam faltando: as pessoas e o planeta. Hoje, a sociedade, em particular as gerações futuras, e a biosfera estão arcando e seguirão arcando com as consequências.
Embora a academia e grande parte das estruturas legislativas e de governança que regulam a economia mundial tenham adotado essa doutrina, alguns empreendedores em diferentes partes do mundo decidiram seguir por caminhos ainda inexplorados, indo além da primazia dos acionistas e considerando a empresa um sistema vivo e interdependente, que prospera se os outros prosperarem ao seu redor.
Hoje, seguir esse exemplo e e evoluir de um paradigma econômico “extrativista” para um mais “regenerativo” é, provavelmente, o desafio mais importante da história humana. O primeiro extrai mais valor do que gera e o concentra progressivamente, em detrimento da sociedade e do planeta, enquanto o segundo serve aos seres humanos e à vida na Terra. Atividades econômicas que extraem ou destroem mais valor do que criam deveriam ser interrompidas e tornadas ilegais.
Em 2016, a Itália se tornou o primeiro país além de alguns Estados dos EUA, a introduzir o status legal de Società Benefit(ou Sociedade de Benefício), que identifica as empresas com duplo propósito, ou seja, aquelas que buscam objetivos de impacto positivo na sociedade e no meio ambiente, além do lucro. Hoje, esse status legal foi introduzido não apenas em 37 estados dos EUA, mas também na Colômbia (2018), Porto Rico (2018), Equador (2019), Canadá-Colômbia Britânica (2019), Peru (2020) e Ruanda (2021), e em mais de 10 outros países, o processo legislativo para a aprovação de uma lei ad hoc está em andamento. Na Europa, há ainda o caso singular da França, que introduziu, em 2019, a assim chamada Société à Mission, que, embora tenha diferenças significativas em relação ao modelo internacional de Sociedade de Benefício, é relativamente parecida em termos de valores e de estrutura básica.
Na Itália, mais de 3000 empresas já optaram por mudar seu status legal de uma simples SRL ou SPA para uma Società Benefit até 2023.
Empresas como Aboca, Chiesi, Davines, Novamont, Number 1, illy, Save the Duck, Florim e Danone Italia, decidiram proteger sua vocação e formalizar o compromisso de suas organizações com a busca dos objetivos do Bem Comum: elas introduziram oficialmente a consideração pelas partes interessadas em sua governança.
Nos últimos anos, marcados por uma crise sanitária e social, muitas empresas estão mostrando a melhor face do empreendedorismo italiano e contribuindo ativamente com ações fortes e concretas para apoiar as comunidades em que atuam. Mas por que não fazer isso também fora dos momentos de crise? Por que não fazer deste um elemento fundacional e contínuo de sua atuação?
A recente carta de Larry Fink, da BlackRock, “a todos os CEOs” das empresas investidas enfatiza: “Quanto mais sua empresa conseguir demonstrar seu propósito de gerar valor para seus clientes e funcionários e para as comunidades que atende, mais competitiva ela se tornará e mais poderá gerar lucros sustentáveis de longo prazo para os acionistas.” Essa declaração sinalizou o fim de uma era e o início de uma transformação radical dos modelos econômicos e financeiros. As Sociedades de Benefício são projetadas precisamente para incluir as partes interessadas no modelo de criação de valor e, portanto, estão, por natureza, alinhados com a nova visão dos principais investidores.
Todas as empresas italianas, públicas e privadas, têm, portanto, uma grande oportunidade de dar esse passo evolutivo e, assim, contribuir para resolver os grandes desafios sociais e ambientais de nosso tempo.
Sem a participação das empresas, nós não seremos capazes de enfrentá-los. Com as Sociedades de Benefício, conseguiremos sair vitoriosos.